Nascido
a 19 de Março de 1839, em Portugal, na Freguesia de Águas Santas, hoje
integrada no Conselho da Maia, e desencarnado em São Paulo, no dia 22 de
Janeiro de 1909.
Completada a sua instrução primária, veio para o Brasil, com apenas onze anos
de idade, aportando no Rio de Janeiro, a 3 de Janeiro de 1850.
Seu
nome de origem era António Gonçalves da Silva, entretanto, devido a ser um moço
muito activo, correndo daqui para acolá, a gente da rua o apelidara "o
batuíra", o nome que se dava à narceja, ave pernalta, muito ligeira, de
voo rápido, que frequentava os charcos na várzea formada, no actual Parque D.
Pedro II, em S. Paulo, pelos transbordos do rio Tamanduateí. Desde então
o cognome "Batuíra" foi incorporado ao seu nome.
Batuíra
desempenhou uma série de actividades que não cabe registrar nesta concisa
biografia, entretanto, podemos afirmar que defendeu calorosamente a ideia da
abolição da escravatura no Brasil, quer seja abrigando escravos em sua casa e
conseguindo-lhes a carta de alforria, ou fundando um jornalzinho a fim de
colaborar na campanha encetada pelos grandes abolicionistas Luiz Gama, José do
Patrocínio, Raul Pompéia, Paulo Ney, António Bento, Rui Barbosa e tantos
outros grandes paladinos das ideias liberais.
Homem
de costumes simples, alimentando-se apenas de hortaliças, legumes e frutas,
plantava no quintal de sua casa tudo aquilo de que necessitava para o seu
sustento. Com as economias, adquiriu os então desvalorizados terrenos do Lavapés,
em S. Paulo, edificando ali boa casa de residência e, ao lado dela, uma rua
particular com pequenas casas que alugava a pessoas necessitadas. O tempo
contribuiu para que tudo ali se valorizasse, propiciando a Batuíra apreciáveis
recursos financeiros. A rua particular deveria ser mais tarde a Rua Espírita,
que ainda lá está.
Tomando
conhecimento das altamente consoladoras verdades do Espiritismo, integrou-se
resolutamente nessa causa, procurando pautar seus actos nos moldes dos preceitos
evangélicos. Identificou-se de tal maneira com os postulados espíritas e evangélicos
que, ao contrário do "moço rico" da narrativa evangélica, como que
procurando dar uma demonstração eloquente da sua comunhão com os preceitos
legados por Jesus Cristo, desprendeu-se de tudo quanto tinha e pôs-se a seguir
as suas pegadas. Distribuiu o seu tesouro na Terra, para entrar de posse daquele
outro tesouro do Céu.
Tornou-se
um dos pioneiros do Espiritismo no Brasil. Fundou o "Grupo Espírita
Verdade e Luz", onde, no dia 6 de abril de 1890, diante de enorme
assembleia, dava início a uma série de explanações sobre "O Evangelho
Segundo o Espiritismo".
Nessa
oportunidade deixara de circular a única publicação espírita da época,
intitulada "Espiritualismo Experimental" redigida desde setembro de
1886, por Santos Cruz Junior. Sentindo a lacuna deixada por essa interrupção,
Batuíra adquiriu uma pequena tipografia, a que denominou "Tipografia Espírita",
iniciando a 20 de maio de 1890, a publicação de um quinzenário de quatro páginas
com o nome "Verdade e Luz", posteriormente transformado em revista e
do qual foi o director responsável até a data de sua desencarnação. A
tiragem desse periódico era das mais elevadas, pois de 2 ou 3 mil exemplares,
conseguiu chegar até 15 mil, quantidade fabulosa naquela época, quando nem os
jornais diários ultrapassavam a casa dos 3 mil exemplares. Nessa tarefa
gloriosa e ingente Batuíra despendeu sua velhice. Era de vê-lo, trôpego, de
grandes óculos, debruçado nos cavaletes da pequena tipografia, catando, com os
dedos trémulos, letras no fundo dos caixotins.
Para
a manutenção dessa publicação, Batuíra despendeu somas respeitáveis, já
que as assinaturas somavam quantia irrisória. Por volta de 1902 foi levado a
vender uma série de casas situadas na Rua Espírita e na Rua dos Lavapés, a
fim de equilibrar suas finanças.
Não
era apenas esse periódico que pesava nas finanças de Batuíra. Espírito
animado de grande bondade, coração aberto a todas as desventuras, dividia também
com os necessitados o fruto de suas economias. Na sua casa a caridade se
manifestava em tudo: jamais o socorro foi negado a alguém, jamais uma pessoa
saiu dali sem ser devidamente amparada, havendo mesmo muitas afirmativas de que
"um bando de aleijados vivia com ele". Quem ali chegasse, tinha cama,
mesa e um cobertor.
Certa
vez um desses homens que viviam sob o seu amparo, furtou- lhe um relógio de
ouro e corrente do mesmo metal. Houve uma denúncia e ameaças de prisão. A
esposa de Batuíra 1amentou- se, dizendo: "é o único objecto bom que lhe
resta". Batuíra, porém, impediu que se tomasse qualquer medida,
afirmando: "Deixai-o, quem sabe precisa mais do que eu".
Batuíra
casou-se em primeiras núpcias com Da. Brandina Maria de Jesus, de quem teve um
filho, Joaquim Gonçalves Batuíra, que veio a desencarnar depois de homem feito
e casado. Em segundas núpcias, casou-se com Da. Maria das Dores Coutinho e
Silva; desse casamento teve um filho, que desencarnou repentinamente com doze
anos de idade. Posteriormente adoptou uma criança retardada mental e paralítica,
a qual conviveu em sua companhia desde 1888.
Figura
bastante popular em S. Paulo, Batuíra tornou-se querido de todos, tendo vários
órgãos da imprensa leiga registrado a sua desencarnação e apologiado a sua
figura exponencial de homem caridoso e dedicado aos sofredores.