* Francisco Cândido Xavier *

 

           

            Nasceu em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, no dia 2 de Abril de 1910. Desencarnou (faleceu),em Uberaba, no dia 30 de Junho de 2002. Seus pais, João Cândido Xavier e Maria João de Deus, dando-lhe o nome de Francisco Cândido Xavier.

            Renasce Chico numa família composta de muitos irmãos e extremamente pobre. Sofre ele todos os reveses da vida, desde a mais tenra idade.

            Quando Chico retorna ao plano físico, Pedro Leopoldo, sua cidade berço era muito pacata. O povo simples, cordial, porém muito conservador. Por esse motivo, houvera muita tristeza e indignação até na pequena cidade, porque por volta de 1901 mudaram o nome da cidade, que era chamada de Cachoeira das Três Moças para Pedro Leopoldo, em homenagem ao engenheiro que conseguira levar a linha férrea da Central do Brasil até àquele local, mais conhecido por se tratar de uma zona metalúrgica, no meio do sertão mineiro.

            Apesar da alegria de alguns e a insatisfação de outros, é que o fato foi muito comemorado na pequenina cidade. Os homens saíram às ruas para ouvir a banda de música, assistir a queima de fogos e tomar a "boa cachaça" que fora servida gratuitamente, pelos donos dos pequenos bares ali existentes.

            Os comerciantes de algumas lojinhas achavam que a vida iria melhorar muito, pois com a passagem da estrada de ferro, muitas pessoas ficariam conhecendo a agora cidade de Pedro Leopoldo. Para o vigário da igrejinha local, isto era preocupante, pois as rezas e as missas poderiam ficar prejudicadas.

            As famílias estavam maravilhadas com o trem. Era só este apitar, e todos corriam para a estação, para ver a maria-fumaça correndo pelos trilhos e anunciando sua chegada. E enquanto todos os passageiros não desciam do trem, ninguém arredava pé da estação. Era novidade ver quem chegava para ver a cidade, que estava sendo apontada como a única que, pelos arredores, ganhara uma estação de trem.

            Com isto, as mulheres acharam mais um meio de aumentar a renda familiar e passaram a vender os famosos quitutes mineiros e, principalmente, o tão famoso pão de queijo aos visitantes ou àqueles que estavam de passagem.

            O vigário, por sua vez, tocava o sino chamando os fiéis, mas enquanto o trem não chegasse ou partisse, a igreja ficava vazia.

            Chico cresceu em meio desta simplicidade, como simples fora seu espírito, já munido de humildade e sem maldades. Até os cinco anos, Chico era um menino como qualquer outro. Corria pelo quintal de sua modesta casa, subia em árvores, ficava feliz por ver os pássaros voarem e cantarem. Mas, repentinamente, sua mãezinha, Maria João, adoece. Seu João, seu pai, acreditava que o acontecimento era passageiro e que logo dona Maria estaria novamente à frente das tarefas, e cuidando da grande prole, pois já eram nove pessoas nesse lar.

            Dona Maria sentia que piorava dia a dia. Sua preocupação tomava vulto. Seu esposo, João Cândido, estava desempregado. Vivia de vender bilhetes de lotaria, e como Pedro Leopoldo era muito pequeno para esse serviço, ele saia pelas cidades vizinhas como Sabará, Tiradentes, Conceição do Mato Dentro, Curvelo e, às vezes, chegava até Belo Horizonte, quando alguém lhe oferecia uma carona. Com isto, chegava a ficar vários dias fora de casa.

            Que fazer? - pensava Dona Maria! Uma ideia surgiu-lhe à mente. Consultaria os amigos e os parentes e pediria para que criassem seus filhos. Seriam distribuídos, para não ficar muito para cada um.

            Ciente desse acontecimento, após dona Maria ter realizado seu pensamento, sendo atendida pelos amigos e parentes, Chico prostrou-se ao pé da cama e com as lágrimas a correr-lhe pelo rosto, fixou-se firmemente em duras palavras para sua mãezinha, que o olhava aflita, e este disse:

            - Por quê, mamãe, a senhora está dando seus filhos para os outros? A senhora não nos quer mais?

            Dona Maria contendo a emoção, segurando as mãozinhas daquela criança que começava a sofrer a dura realidade da vida material, falou:

            - Não é isto meu filho, é que tenho que ir para o hospital e não sei quanto tempo vou ficar lá. Mas creia-me, eu os amo imensamente! Deus, nosso Pai, sabe o quanto me dói em ter que separar vocês. Mas é por pouco tempo.

            Chico mais calmo, acariciando o rosto de sua terna mãezinha, continuou:

            - Mamãe, a senhora vai morrer?

            Dona Maria, firme em seus propósitos cristãos, deixou claro ao filho:

            - Se alguém, Chico, disser que eu morri, não acredite, é mentira. Apenas vou dormir por algum tempo, para descansar desta doença, mas depois voltarei, estarei ao seu lado sempre.

            Chico, mais calmo, despediu-se de dona Maria, sendo abençoado por esse coração materno, que realmente orientou as horas amargas do nosso amigo.

            E no dia seguinte, a 29 de Setembro de 1915, desencarna dona Maria João de Deus, acolhida no plano espiritual por ter cumprido sua tarefa na Terra, dando oportunidade a muitos espíritos reencarnarem, e principalmente pelo retorno à grandiosa missão que nosso Francisco Cândido Xavier teria que realizar, para a continuidade dos esclarecimentos da obra doutrinária, deixada em meio pelo mestre Allan Kardec.

            Aí começaram as amarguras e grandes dores ao pequeno menino. Chico chorou convulsivamente a partida de sua amada mãezinha. Porém, guardara em seu interior a mensagem que disse ao se despedir: "estarei sempre com você, eu não vou morrer". Isto lhe serviu de alento.

            Chico foi morar com sua madrinha, dona Maria Rita de Cássia, que fora amiga íntima de sua mãezinha. Mas ali começaria o calvário do menino.

            Dona Ritinha, como era chamada pelo mais próximos, era muito severa, e a qualquer momento, e algo que Chico fizesse de errado, a vara de marmelo cantava nas costas dele.

            Se fosse só isso, ainda seria suportável, porém, o pior é que além de apanhar, levar pescoções, beliscões, dona Ritinha acha por bem espetar garfos na barriga do menino. Chico chorava, Ritinha, mas de nada adiantava. O sangue corria-lhe pela barriga, e com isto abriu-se uma enorme ferida em sua barriga. A dor era tanta que Chico tinha até dificuldades de andar e de ir até o fundo do quintal, que era o único lugar de paz para ele. Ali ele chorava, lamentava-se e pedia socorro a Deus e à sua mãezinha.

            Foi num desses dias que, além das surras e dos garfos espetados, e de ter que vestir um camisolão pintado de azul, feito de pano de saco, Chico desesperado pediu a Jesus uma resposta. Onde estará minha mãe? Ela disse que estaria sempre ao meu lado, porque ela não está aqui?
Repentinamente, dona Maria João aparece ao seu lado. Chico chorando convulsivamente e com seu pensamento de criança, rogou à mãe:

            - Mamãe, por favor, quero ir embora com a senhora. Leve-me mamãe, quero ficar com a senhora, só vivo apanhando e sou obrigado a vestir essa roupa de menina. Por quê a madrinha faz isso comigo? Ela diz que vivo com o diabo no corpo. É verdade, mamãe?

            Dona Maria acariciava sua cabecilha e dizia:

            - Tenha paciência meu filho, ela não faz por mal, ela apenas quer que você seja obediente, e lembre-se de que, quem não sofre não aprende a lutar, para que o bem se fortaleça em nós. Não se importe com a sua roupa, e nem com o diabo. Lembre-se de orar a Jesus, por ela, e para que você não retenha o mal no seu coração. Tudo irá passar, e nós estaremos sempre juntos. Virei ajudá-lo nas orações.

            A partir daí, Chico ficou mais resignado, já não chorava, nem por apanhar e nem pelos garfos. Dona Ritinha achou que ele estava ficando cada vez mais "aluado", e dizia para os vizinhos: "Diz ver sua mãe que já morreu, e com isto demonstra cinismo quando apanha, pois não derruba nem uma lágrima."

            Piores situações ainda estavam por vir para os sofrimentos do pequeno Chico. Dona Ritinha criava um filho adoptivo, de nome Moacir, que abeirava seus doze anos. Ele, há tempos, tinha uma enorme ferida na perna de aspecto desagradável. Dona Ritinha já havia recorrido a todos os meios e nada da ferida secar.

            Procurou, então, os préstimos de uma famosa benzedeira local. Dona Ana Batista, após ver o problema, falou:

            - Olha dona Ritinha, aqui só mesmo uma simpatia para dar certo, só isto poderá me ajudar nas rezas.

            - E como é essa simpatia? - perguntou dona Ritinha aflita.

            - Durante três sextas-feiras, essa ferida terá que ser lambida por uma criança em jejum.

            Dona Ritinha, após um espanto, pensou e perguntou: - O Chico serve para fazer isso?

            - Serve sim. Ele não é aquele menino aluado que você passou a cuidar, depois que a mãe dele morreu?

            - É ele mesmo!

            - Óptimo, ninguém seria mais perfeito para isso.

            À tarde, Chico já sabia do que o esperava. Saiu correndo para o quintal. Precisava falar com sua mãezinha. Chorando muito, quando a viu, contou tudo e a sua repugnância pelo fato de ter que lamber a ferida do irmão adoptivo.

            Dona Maria João, acariciando o rosto do pequeno disse:

            - Você deve obedecer a sua madrinha. Lembre-se de que Jesus nos ensina paciência e abnegação.          Pense que você está fazendo o bem, é melhor do que deixar sua madrinha nervosa.

            - E a ferida vai secar? - pergunta Chico agora mais resignado.

            - Não, porque isso não é remédio, mas com sua humildade, nós teremos condições de fazer o remédio e a cura se fará.

            Diante disto, e tendo a cobertura de sua mãezinha, no dia seguinte o Chico começou o tratamento. No princípio ele sentiu raiva por ter que fazer aquilo tão nojento, mas com a ajuda de dona Maria, que ele via ao seu lado, dando-lhe forças, ele lambia a ferida e pensava: "Como eu queria que a minha língua fosse bem grande para com só uma lambida, o problema passasse e acabaria logo este tormento."

            Na terceira sexta-feira, a ferida já estava quase cicatrizada. Chico deu graças a Deus e implorou à sua mãe para dar um jeito de ninguém aparecer com feridas, ali pelos arredores de Pedro Leopoldo. Dona Maria o abraçou e lhe disse:

            - Você vai se dar muito melhor com sua madrinha de agora em diante, meu filho.

            Pela primeira vez, dona Ritinha, após dois anos de convivência com o menino, aproximou-se dele de forma carinhosa e lhe disse:

            - Muito bem Chico, você obedeceu e fez tudo direitinho. Louvado seja Deus! - e abraçou-o comovidamente.

            Chico ficou contente, até feliz, porque lembrou dos conselhos de sua mãezinha, ela tinha razão, pois não apanhou mais e nem dona Ritinha o machucou com os garfos em sua barriga.

            Chico sempre que lembrava este fato, dizia que aprendera a reconhecer em dona Ritinha, sua grande educadora.

            Casos pitorescos aconteciam na vida do menino Chico. Para muitos ele era lunático, mas ele era uma criança normal. Apesar do pouco tempo que dispunha, ele gostava de jogar bola, mas as crianças o evitavam, pois diziam que ele era estranho. Mas, certa feita, ele foi convidado por um dos meninos do bairro onde viviam, a comparecer em seu aniversário.

            Como era muito tímido e sabedor que se fosse, todas as crianças zombariam dele chamando-o de lunático, Chico não queria ir, mas dona Ritinha fez com que aceitasse, e lá foi o Chico com seu irmão adoptivo, o Moacir, a quem Chico lambera a ferida.

            Como era natural as crianças jogavam bola. Ele se entusiasmou e entrou na brincadeira. As crianças ficaram meio paradas sem saber se Chico ficaria na brincadeira ou não, mas após cochichos daqui e dali, deixaram-no jogar. Logo após, a bola acertou a cabeça de um dos meninos e este vai ao chão. A gritaria foi enorme, o menino chorava dizendo que a cabeça doía. O pai vem ao socorro do filho, e muito nervoso, pergunta o que havia acontecido, e os outros em coro apontaram Chico, dizendo que ele havia jogado a bola para cima, sem respeitar as regras do jogo. O pai com o filho, meio cambaleante, exige que o Chico faça alguma coisa, dizendo:

            - Você foi o culpado, seu lunático, por isso como você vive falando com fantasmas, faça meu filho ficar bom, senão irei falar com dona Ritinha.

            Chico, chorando muito, pois não havia nem pego na bola, dizia que não sabia o que fazer. Subitamente, ele vê sua mãezinha que pede para ele se acalmar e passar a mão na cabeça do amiguinho, que ela iria ajudá-lo. Chico obedece, e logo após o garoto para a choradeira e reequilibrado, pede que todos recomecem o jogo. Chico sente um alívio no coração. Graças a Deus e à sua mãezinha, ele não iria retornar a apanhar de sua madrinha, dona Ritinha.

            Os garotos e o pai do que havia se machucado, reconheceram que Chico não tivera culpa e que graças a ele e à sua maluquice com os fantasmas, tudo ficara bem. Pediram desculpas, e tudo ficou em paz.

            E, fatos como este foram se sucedendo na vida deste missionário, que muito teria ainda que mostrar ao mundo.

            Com o passar do tempo, seu João Cândido não suportava mais a solidão, e casa-se novamente. Logicamente que este acontecimento foi projectado pela espiritualidade. Dona Maria, mãe do Chico, vendo a necessidade do companheiro, e a falta de uma esposa em que pudesse ser confiada a educação e a união familiar, pede aos espíritos superiores que a ajudem a encontrar alguém que pudesse interceder pelo trabalho grandioso que Chico precisaria desenvolver, e principalmente ajudar aos irmãos na reencarnação.

            E foi aí que seu João Cândido encontra dona Cidália Batista. Ela durante algum tempo, ao desprender-se do corpo pelo sono, havia sido consultada para essa união, ao qual aceitou com pleno agrado, por ter tomado conhecimento da obra grandiosa que Jesus confiara a Francisco Cândido Xavier. Ele, portanto, seria seu filho dilecto, ela seu anjo guardião e também da família de dona Maria João de Deus, sua amiga e parceira da espiritualidade.

            Pela primeira vez, Chico sentiu-se feliz, após a partida de sua mãezinha. Dona Cidália recebeu de braços abertos e ainda mais, fez com que seu pai trouxesse todos seus irmãos para o lar novamente, reunindo dessa forma toda família.

            Chico considerava dona Cidália não como madrasta, mas sua segunda mãe. Confiava todos seus pensamentos a ela.

            Contava-lhe das visões que tinha, do contacto permanente com sua mãezinha. Da alegria de dona Maria João, por ver todos reunidos. Perguntava, Chico, para dona Cidália o porque que em muitas vezes ele se via em outros lugares, que não era Pedro Leopoldo. Mas ele não podia contar isso para ninguém, pois achavam que ele não "batia bem da cabeça". E isso trazia uma grande tristeza para o seu coração, pois ele gostaria de poder estar na escola e ter muitos amiguinhos.

            Dona Cidália, com toda bondade, explicava ao Chico que não sabia o que queria dizer as visões que ele tinha, mas que ela acreditava, e iria fazer todo o possível, para que ele e os irmãos fossem para escola. "No mais, confie Chico em Deus, que Ele providenciará alguém que explique o porque você vê e ouve vozes que não da Terra".

            Essa laboriosa mulher faz seu João Cândido entender da necessidade dos filhos irem para a escola. Mas, dizia ele, como fazer para comprar livros, cadernos, lápis, para todos? De onde tirar dinheiro? O que ganhava mal dava para o sustento de todos.

            Mulher activa, ela rápido encontrou a solução. O quintal da casa em que moravam era imenso. Havia muita terra que poderia ser transformada em canteiros produtivos.

            Assim foi feito, e belos canteiros de verduras começaram a brotar, animando a família toda para continuar a plantar. Com a venda das verduras e dos legumes colhidos, seu João arrecadava o dinheiro para poder manter os filhos na escola.

            Chico foi matriculado em 1919, no Grupo Escolar São José. Ele não foi um aluno excepcional, pois tinha que ajudar no trabalho da horta e na venda das hortaliças. Repetiu o quarto ano, pois além do trabalho, tinha a saúde frágil e nesse último ano, o qual houve a repetência, passou quase que todo acamado. Mas as suas visões com o Além estavam cada vez mais acentuadas. Ele já passara a conversar com os espíritos aceitando, por assim dizer "ser normal".

            Em 1922, todo o país estava em festa. Comemorava-se a Independência do Brasil. O Governador de Minas Gerais criou vários prémios para o aluno da escola que apresentasse a melhor redacção sobre a história do Brasil.

            Chico cursava o quarto ano e estava com 12 anos, por essa época. Dona Rosaria Laranjeira, sua professora, marcou o início da redacção para o dia seguinte, e falou que todos os alunos deveriam vir preparados para fazer a melhor redacção possível.

            Quando Chico foi iniciar o trabalho, viu que um homem estava ao lado da carteira e disse-lhe que não temesse, pois ele o ajudaria na redacção, portanto, que começasse a escrever o que ele ditasse. Chico assustado, perguntou ao aluno do seu lado se ele também via e ouvia o que o homem estava dizendo, pois ele não falava baixo. O menino começou a rir, e disse que ele deveria estar mesmo confirmando o que todos falavam, que era lunático mesmo.

            Chico, inconformado pediu licença para dona Rosaria e chegando perto dela, falou do acontecido. Dona Rosaria muito católica, mas extremamente compreensiva, perguntou ao Chico o que o homem ditava para ele escrever.

            Chico repetiu, pois ouvira várias vezes, diante do seu temor em escrever: Ele ditou: "O Brasil, descoberto por Pedro Álvares Cabral, pode ser comparado ao mais precioso diamante do mundo, que logo passou a ser engastado na coroa portuguesa".

            A professora ouviu espantada e admirada pela bela frase mandou o Chico concluir o trabalho e disse: "Não importa se o trabalho foi ou não ditado por um homem invisível, o importante é terminar e entregar a redacção".

            Tempos depois a Secretaria de Educação de Minas Gerais entregava o resultado do concurso que fora disputado por muitos estudantes, em todo o Estado. E coube ao nosso querido Chico o prémio, com menção honrosa.

            Os boatos correram solto. Chico era taxado de mentiroso, e que ele por certo teria copiado de algum livro o que escrevera, pois ele era incapaz de escrever algo útil, por ser lunático.

            Chico procurava se defender, dizendo que havia contado à professora de que um ser sobrenatural havia lhe ditado o assunto. Mas a professora mandou-o seguir com o trabalho.

            Um dos alunos fez um desafio: já que esse ser invisível existia, então ele deveria apresentar-se novamente, só que para escrever sobre algum assunto proposto pelos alunos, ali naquele instante.

            Chico viu o homem reaparecer e aceitar o desafio. Pedira a Chico que se tranquilizasse. A professora, que tudo acompanhava se fez de mediadora e aceitando o desafio, pediu ao Chico que fosse ao quadro negro e escrevesse diante de todos, para confirmar a veracidade do fato.

            Que tema seria? - perguntou um dos alunos. Uma aluna que morava numa casa em reformas, sugeriu que o tema fosse sobre a areia. As risadas foram unânimes. Areia, que tema sem sentido! Mas, por ponderações da professora, o tema foi aceito.

            E Chico passou a escrever sob a pressão manual do espírito, que ditava: "Meus filhos, ninguém escarneça da criação. O grão de areia é quase nada, mas parece uma estrela pequenina reflectindo o sol de Deus".

            Depois disso, a professora proibiu qualquer comentário a respeito de "coisas do outro mundo", ou desfeitas e ofensas ao Chico, pois que seria impossível, a um menino de doze anos, fazer tantas colocações de alto teor, a respeito de assuntos com tantas profundidades e tão verdadeiros.

            Dessa forma Chico foi se desenvolvendo em meio a mil dificuldades. Com as visões do além sempre contínuas, seu pai, a conselho do padre Sebastião Scarzelli, quis ter um diálogo com o menino, pois dizia ser um absurdo pensarem em interná-lo num sanatório. Que tudo o que ele dizia ver e ouvir, deveria ter um acompanhamento psiquiátrico, pois fugia ao seu entendimento como padre católico.

            A solução dada pelo padre, com a insistência do senhor João Cândido, era para que colocasse o menino na fábrica de tecidos. Dessa forma, aumentaria o orçamento da casa e Chico trabalharia o dia todo, sem tempo para visões.

            Chico passou a trabalhar das três da tarde até a madrugada. Dormia até as seis, levantava e ia para a escola. Saía às onze para o almoço, quando procurava descansar um pouco, e logo após voltava ao trabalho como tecelão.

            Com o tempo a poeira do algodão começou a prejudicar os seus pulmões e, a conselho médico, teve que trocar de emprego.

            Em 1923, Chico consegue concluir o curso primário. Sua professora, dona Rosaria Laranjeira, conhecendo em Chico grandes potencialidades intelectuais, quis levá-lo para Belo Horizonte, para que ele pudesse estudar, pois ela estaria disposta a custear seus estudos. Mas, seu João Cândido não concordou, pois o salário do menino, iria fazer muita falta, pois além dos nove filhos do primeiro casamento, nasceram mais seis com Cidália.

            Em 1925, Chico passa a trabalhar no comércio, como auxiliar de cozinha no Bar do Dove. Depois, na venda do senhor José Felizardo Sobrinho. Horário puxado. Mas o que mais deixa esse adolescente triste, era o de ter que vender bebida alcoólica. Pois os alcoólatras bebiam, caíam e Chico tinha que carregá-los e levá-los para a casa. Isso o deixava arrasado.

            Por insistência do padre Scarzelli, Chico passou a frequentar as missas aos domingos, a confessar e a comungar, e ainda fazer parte das procissões. Com isto, o menino lunático ficou no passado e dona Maria João não aparecera para ele.

            Uma das irmãs de Chico, Maria da Conceição, começou a apresentar violentos acessos de loucura, isto por volta de 1927. Tomadas todas as providências o caso não melhorava.

            Esse fato chegou aos ouvidos do casal, médiuns, o senhor Hermínio e Carmem Perácio. Maria da Conceição, a pedido deles, foi levada pelo pai à casa desses, que constataram grave problema obsessivo. Querendo ou não, a família de Chico, inclusive ele, passaram a frequentar as reuniões, e Maria da Conceição foi recebendo tratamento espiritual e, a olhos vistos, começou a apresentar melhoras.

            Para Chico foi uma surpresa quando numa determinada noite de estudos Evangélicos, após sete anos, ele revê sua mãezinha. Chora convulsivamente. Chico recebe uma mensagem psicografada por Dona Carmem, onde ela escreve: "Filho, confie em Deus, lembre-se sempre em ser bom e digno. Você tem uma longa estrada pela frente, para realizar um trabalho árduo por caminhos pedregosos, mas Jesus enviará seus mensageiros para ajudá-lo. Estude, trabalhe e confie, pois Deus espera muito desta sua reencarnação, para que dê bons frutos". Maria João de Deus
Chico nesse instante deduziu que sua vida estava, portanto, descrita em três períodos fundamentais para ele.

            A primeira fase de incompreensão mediúnica, por ver sua mãe e com cinco anos não conseguir atinar o porquê. A segunda fase, até aos dezassete anos, onde sentia a influência de espíritos felizes e infelizes, a se fazerem presentes constantemente em sua vida de adolescente, e a terceira fase, onde ele encontra a resposta para tudo, quando recebe mensagem de sua mãezinha.

            Depois dessa importante reunião mediúnica, fixou-se a ideia de organizarem um centro espírita em Pedro Leopoldo, dando início, dessa forma, à luminosa trajectória mediúnica de Francisco Cândido Xavier.

            Durante quatro anos, com paciência e humildade, Chico, foi aprendendo a psicografar. No início, ficava extenuado. Depois, foi se amoldado às mãos dos Espíritos. Aí, era só pegar lápis e papel que a mensagem fluía. (Trecho do livro "Chico Xavier, uma Vida de Amor" De Ubiratan Machado.)

            Em 1931, Chico procurava meditar e descansar sempre em baixo de uma bela árvore que ficava perto de um açude, na saída para a estrada, após deixar-se Pedro Leopoldo. Lugar belíssimo.

            Repentinamente ele vê um Espírito vindo ao seu encontro. Vestia-se com uma túnica. Elegantemente com gestos educados, cumprimentou Chico. Luzes circundavam esse Espírito que deixaram o nosso Chico emocionado, pois sentia-lhe a gloriosa fluidificação. Chico apressou-se a perguntar o porque dessa magnífica aparição, a qual a entidade apresenta-se como Emmanuel e indaga de Chico:

            - Queres trabalhar mediunicamente na expansão do Evangelho de Jesus? Confiar sua vida em ser servidor abnegado aos princípios da Lei de Amor?

            - Sim - responde Chico ainda sob forte emoção - mas o senhor acha que estou à altura de tão sublime missão? Sei que a mediunidade é de suma responsabilidade e, além de procurar esclarecer-me através do empenho à tarefa, que mais o senhor me ensina?

            Emmanuel, olhando fixamente para Chico, e vendo sua vontade e sinceridade em sua mente, diz-lhe:

            - Desde que você se propõe ao serviço é preciso que você respeite três pontos fundamentais para que tudo transcorra bem: 1º disciplina - 2º disciplina - 3º disciplina.

            Desse dia em diante, Emmanuel tornou-se a estrela guia na vida do médium, que dedicou-a inteiramente às obras Mediúnicas, tornando-se o Evangelho vivo sobre a Terra, pois tudo o que recebeu do Alto, passou a exemplificar, tal como fez o Mestre Jesus.

            Nesse mesmo ano 1931, Chico recebe o primeiro poema, com a assinatura de um grande poeta que fora Casimiro Cunha. Chico não o conhecera, evidentemente, pois o poeta vivera e morrera em Vassouras, em 1914.

            Depois, muitos outros poemas foram sendo psicografados e assinados por grandes literatos, como: Olavo Bilac, Fagundes Varela, João de Deus, Guerra Junqueiro, Dom Pedro II, Cruz e Souza e muitos outros.

            Por esses acontecimentos, toda Pedro Leopoldo fervia em comentários. Para uns, Chico, após uma pausa viera novamente a se tornar lunático, para outros ele piorava e muito. Como ficar vendo e ouvindo gente morta, há tanto tempo, o dia inteiro?

            Mas o médium mineiro, auxiliado por Emmanuel continuou sua missão. Sabia agora, mais do que nunca, que seu trabalho material, continuava ganhando o suado pão de cada dia, ajudando a manter a família.

            Em 1932, Manuel Quintão da Federação Espírita Brasileira, sabedor e conhecedor das poesias Mediúnicas, pediu ao Chico que as reunisse todas, pois era preciso editá-las em livro.

            Assim, apesar de todos os prós e contras, surge ao mundo o primeiro livro psicografado por Francisco Cândido Xavier, com o nome de Parnaso de Além-Túmulo.

            A gritaria foi geral, jornais do Rio de Janeiro e São Paulo mandaram repórteres e fotógrafos a Pedro Leopoldo, para publicarem e mostrarem ao país inteiro, a espíritas e não espíritas, o mineirinho de 22 anos, que de repente saíra do anonimato, para ser mostrado como real ou mistificador, por ousar colocar nomes tão respeitosos e tão conhecidos nos meios literários, nessa obra do Além!

            Sabedor e estudioso profundo da literatura, Monteiro Lobato escrevera para os jornais o seguinte:

            "Se, Chico Xavier, conseguiu escrever tudo o que está ali contido no livro Parnaso, diria que ele mereceria ocupar quantas cadeiras quiser na Academia Brasileira de Letras".

            Menotti Del Picchia escreve: "Francisco Cândido Xavier deve ser um fenómeno, para ressuscitar espiritualmente todos esses grandes poetas, com poesias inéditas e tão ao estilo de cada poeta. Sendo assim, só mesmo pelo prodígio desse ser, que poderemos contar com a continuidade dessas belas páginas vindas do sobrenatural".

            Críticas maldosas também fizeram parte dos periódicos, revistas e até livros da época.

            R. Magalhães Júnior, escritor famoso e crítico audaz, dizia que Chico era um embusteiro de grande genialidade, pois receber obras em francês e em outras línguas, era querer se projectar demais. Isto por volta de 1944, quando Parnaso do Além-Túmulo já alcançava a quarta edição, e muitas eram as mensagens psicografadas por Chico, onde muitos espíritos manifestavam seus conhecimentos e procuravam acender a fé nos corações das pessoas que o procuravam para se orientar.

            Mais críticas chegavam dos católicos. O padre Júlio Maria, da cidade de Manhumirim, Minas Gerais, escrevia para o jornal O Lutador: "Chico Xavier deve ter uma pele de rinoceronte. Se assim não for, como suportar tantos espíritos em suas costas! Ou estará ele caminhando para a loucura definitiva, o que, aliás, é o mais certo".

            Tudo isto estava arrasando com o ânimo do nosso Chico. Abatido, começou a sentir-se doente. Procurava afastar-se dos trabalhos do Centro, desculpando-se com os horários de seu trabalho material. Porém, Emmanuel, após uma pequena pausa, apareceu-lhe com uma severa repreensão, fazendo-o restabelecer-se rapidamente.

            O padre Júlio Maria continuou suas críticas por mais 13 anos, e fazendo tudo para que Chico recebesse o jornal, e ficasse sabendo de suas terríveis ideias sobre sua mediunidade.

            Certa vez, em Belo Horizonte, Chico foi procurado por uma pessoa que lhe disse que poderia arranjar-lhe um óptimo emprego, mas que para isso acontecer ele deveria renunciar ao Espiritismo, e declarar publicamente que o livro Parnaso era uma obra sua e não dos espíritos, do sobrenatural.

            Chico, com toda firmeza de seu coração negou veementemente a proposta.

            Esta pessoa, então, continuou:

            - Chico, você conhece um passarinho que se chama, sofrê?

            - Não, diz Chico.

            - Pois, diz o amigo, você é o pássaro "sofrê", porque se ilude achando que os espíritos escrevem pelas suas mãos ou como o pássaro, só imita os outros.

            Repentinamente, Chico ouve a voz de Emmanuel:

            "Volte imediatamente a Pedro Leopoldo e procure se dedicar ao trabalho, pois você não é sofrê, mas vai precisar sofrer muito para aprender a se desligar do que é inútil".

            Outro fato inédito da vida de Chico foi em 1937, no dia 29 de Março, na sede da Sociedade Metapsíquica de São Paulo, quando psicografou uma mensagem em inglês, do Emmanuel, numa escrita invertida, podendo só ser lida, se colocada à frente do espelho ou contra a luz, isto, para servir de testemunha da mediunidade de Chico, sendo esta chamada de xenografia, isto é, escrever em idiomas desconhecidos pelo médium.
Aqui apresentou-se dois fenómenos: um da escrita invertida e a outra do idioma (desconhecimento da língua).
A vida dessa criatura, enviada por Deus, nesta reencarnação, foi a maior dádiva Divina. Foram anos dourados sobre a Terra, e grande responsabilidade daqueles que puderam conhecê-lo e participar do seu convívio.

            A fama de Chico crescia dia a dia. Todos queriam conhecer essa estranha criatura que falava com fantasmas. Mas com toda sua humildade e recebendo o apoio de Emmanuel, Chico começou a receber a visita e o convite do Dr. Bezerra de Menezes, para que se iniciasse, no Centro Espírita, o receituário homeopático que ele, Dr. Bezerra prescrevia as receitas com orientações, pois muitos que ali compareciam eram doentes do corpo e, principalmente, do espírito.

            Chico aceitou de bom grado, pois seu enorme coração jamais se recusaria a ajudar a quem quer que fosse. Dessa forma, Pedro Leopoldo, tornou-se a cidade do Espiritismo Brasileiro. Romarias vinham de todas as partes do país.

            Carros de todos os tipos da época traziam pessoas da alta sociedade, como se falava nesse tempo, pois quem possuía carro, naquela época, é porque tinha muito dinheiro. Mas chegavam também carros de boi, que traziam as pessoas da roça, que moravam nos arredores da cidade. Chico, embora muito jovem, esquecia sua própria vida para dedicar-se inteiramente a cuidar dos semelhantes. Atendia com alegria e paciência a todos, sem discriminar se eram ricos ou pobres.

            Dessa forma, as reuniões, compostas pelos seus amigos, dona Carmem Peracio e esposo, e outros, como seu irmão José, desdobrassem até altas horas, sustentadas pelas pessoas que comentavam o Evangelho segundo o Espiritismo. Já por esse tempo, Chico recebia em média 700 receitas por noite, fora as orientações enviadas por Emmanuel, para aqueles que abriam Casas Espíritas, nesses remotos anos, para levarem os esclarecimentos a outros lugares, semeando a palavra de Jesus.

            Toda essa situação chamou a atenção dos grandes críticos da época. Nomes de intelectuais famosos como Tristão de Athayde, Olegário Mariano, Álvaro Lins, que fizeram como que uma junta literária para estudar e sentir a veracidade dos poemas e mensagens advindas do Além. Chegaram a conclusão, que o estilo de cada um era verídico, principalmente as colocações feitas com o critério normal e sério de um Olavo Bilac, Augusto dos Anjos e outros.

            Outro crítico implacável, por vezes até irónico e sarcástico, quis conhecer de perto o médium. Dizia que só opinaria se seus olhos presenciassem aquilo que chamavam de anormal. Esse crítico severo e temido pelos escritores era o famoso Agripino Grieco. Católico, admirador da igreja e crente de todos os santos.

            Chico estava em visita a casa de seu amigo e professor Cícero Pereira, em Belo Horizonte. Sabedor dessa visita, o senhor Bady Curi vai até a casa do professor e diz ao Chico que Agripino Grieco, gostaria de conhecê-lo e ver de perto o fenómeno psicográfico. Diz Chico, que isso não era imposto e, portanto, as pessoas acreditariam ou não, porém, diante da insistência do senhor Bady, o professor Cícero aconselhou Chico a aceitar e ir ao encontro de Grieco. Esse encontro deu-se no Centro da capital mineira, o salão estava lotado.

            A apresentação feita entre ambos, não ocasionou nenhuma surpresa a Grieco que definiu a pessoa de Chico como um "mestiço magro, meão de altura, cabelos crespos e uma pequena mancha branca num dos seus olhos" (Trecho do livro Chico Xavier - Uma vida de Amor).
Começada a tarefa da psicografia, Grieco viu que o lápis era levado por uma rapidez incrível sobre o papel, coisa impossível para qualquer pessoa, por mais hábil fosse com a escrita.

            A repercussão desse episódio foi intensa nos meios literários e na vida do médium. Mas após esse fato, Chico e Grieco não mais se encontraram, porém, deixou um enigma muito grande na mente de Grieco, que ficou sem explicação para ele, pois o fato foi que ele identificou o modo e as ideias colocadas na crónica escrita por Humberto de Campos, e o soneto assinado por Augusto dos Anjos. Disse Grieco, por fim, que lhe faltava estudos especializados para poder entender o que vira!

            Por volta de 1940, Chico sofre um grave ataque de uremia. Se em 24 horas o caso não se resolvesse ele poderia desencarnar.

            Rezou ele resignado, pedindo a Emmanuel que o recebesse no Além. De imediato, Emmanuel se faz presente e lhe diz:

            - Nada posso fazer. O meu trabalho não me permite perder tempo com suas reclamações. Se chegou a sua hora, peça aos seus amigos do Centro Luiz Gonzaga para auxiliá-lo. Veja que você não é melhor que os outros, e portanto não tem privilégios.

            Dias depois, ele já estava recuperado. A lição de Emmanuel calou em seu coração. Ele não era vítima de nada, a doença acontecia a qualquer um. O importante era saber viver a vida, e aproveitá-la com resignação, grato a Deus pelo bem que estava recebendo, o de poder servir a Jesus, sendo útil ao semelhante, durasse a sua vida o tempo que fosse.

            Ao receber pela psicografia os livros de Emmanuel e André Luiz, Chico é preparado para vivenciar as cenas descritas. Dizia ele que, ao receber as páginas que formaram o livro "Paulo e Estevão", ele chorou do começo ao fim, pois as cenas eram muito fortes e o sofrimento dos personagens ele sentia como se todos os acontecimentos estivessem sendo vividos naquela hora da psicografia.

            Em 1946, Chico torna a adoecer. Seu estado era gravíssimo. O médico diagnosticava tuberculose. Chico fica profundamente abatido. Chora muito, porque ele não tinha como tratar a doença, seus recursos precários e pela limitação da medicina da época também.

            Emmanuel ao vê-lo nesse estado, pousa a mão em seus ombros e diz:

            - Reaja. Sua enfermidade é do corpo debilitado, mas também do seu espírito. Mas, Deus irá nos auxiliar. Ele irá permitir que durante o seu repouso nocturno o tratamento espiritual virá a seu favor. Ore e confie. Procure lembrar-se de mim em suas preces. Irei levá-lo a um lugar de refazimento para o seu espírito doente, e aí você será medicado.

            Ao deitar-se, Chico faz exactamente o que o amigo espiritual lhe pedira. Viu-se passeando num belo local, todo ajardinado, flores perfumadas aromatizavam o ar. A relva de um verde brilhante, como se gotas douradas estivessem sido espalhadas sobre ela. Vendo um banco, notou que um menino cercado de luz alaranjada ali estava junto de Emmanuel, que apresentou-o ao médium. Grande foi o susto de Chico, quando o menino o segurou ao colo, com uma incrível facilidade. Começou a passar suas mãozinhas todas luminosas pelo rosto e corpo do Chico, como que o acariciando e depois aconchegou-o ao peito, como fazem as mães aos filhinhos doentes. Depois de algum tempo lhe diz:

            - Pronto, você já foi medicado em nome de Jesus.

            Ao retornar, ainda em estado sonambúlico, Emmanuel fala: - Você recebeu o remédio em grande dose de transmissão fluídica. Ao amanhecer, você estará forte, sem cansaço, sem febre nem dores no peito. Deus permitiu a sua cura. Assim, Chico acordou bem recuperando-se mais uma vez de uma grave doença.

            Em Julho de 1958, Chico sofre por uma tremenda declaração de Amauri Pena, seu sobrinho, que procurara os jornais, difamando o tio, de mistificador e aproveitador de nomes ilustres, pois ele, seu sobrinho, também sabia imitar os estilos dos grandes poetas e escritores. Apresentou farto material à imprensa, onde deram muitas dores de cabeça ao Chico, que sabia ser o sobrinho dementado e viciado pela bebida. Sofre calado, porém, após algum tempo, veio Amauri desencarnar numa penosa situação de alienação e bebidas, motivado pelo desejo de ganhar muito dinheiro, com os escândalos apresentados porele sobre a vida de Chico. O médium chorou muito o desencarne em tão dolorosa situação do sobrinho, e pelo sofrimento de sua irmã Maria da Conceição.

            Lá pelos idos de 1959, Chico, por problemas de saúde e aconselhado pelos médicos terrenos, e principalmente pelo Dr. Bezerra de Menezes, decide mudar-se para Uberaba. Deixa sua cidade natal, a pequena casinha que o abrigava, seus mais ou menos, entre discos clássicos e populares, livros e objectos de uso pessoal, calculados em cento e poucos, e também um quadro com a foto de Emmanuel, seu orientador espiritual.

            Quem o esperava em Uberaba, com grande ansiedade era o médium e médico Dr. Waldo Vieira.

            Waldo Vieira, através de sua vidência, certa vez, olhando um terreno baldio em frente à casa que habitava com sua mãe, dona Aristina (já desencarnada) e sua tia dona Opala, também desencarnada (estas foram seguidoras e além de amigos, muito o ajudaram no envio das correspondências que chegavam ao Chico, e no envio de mensagens para todo o Brasil e exterior), vira ele uma singela construção, com um salão, contendo em seu interior, uma mesa e ao redor bancos de madeira. Esta imagem muito o impressionou, pois era evidente que seria ali a futura sede de um Centro Espírita. Por momentos, e inspirado por André Luiz, seu guia espiritual, pensou em Chico Xavier, por isso, seu grande empenho em trazer Chico para Uberaba.

            A sede da Comunhão Espírita Cristã até hoje funciona em Uberaba. Chico e Waldo ali trabalharam durante muitos anos em parceria, fazendo vir à luz, muitos e muitos livros psicografados por eles. Entre as obras de André Luiz, Chico e Waldo receberam a psicografia alternada em partes do livro, isto é, ora um ora outro, numa total sintonia, sem alterar o conteúdo da obra espiritual, sendo mais uma confirmação da existência do espírito.
Chico com sua humildade e carisma, muda a vida de Uberaba. A cidade, pacata, porém, bem maior que Pedro Leopoldo, começou a sentir os efeitos trazidos pela mudança de Chico. A cidade começou a aumentar o número de hotéis, pensões, comércio, tudo se modificava, pois grande era o número de visitantes à cidade. Todos queriam conhecer Chico e Waldo Vieira. Queriam receitas feitas pelo Dr. Bezerra, orientações de Chico sobre o movimento espírita, que começara a tomar grande vulto por todos os lugares etc.

            Caravanas de outros países começaram também a interessar-se por conhecer o famoso fenómeno, chamado Francisco Cândido Xavier. E através de uma visita e uma crónica escrita por um articulista sobre a vida de Chico, publicada numa revista argentina, de número de Maio/Julho de 1963, com o título de Conocimiento de La Nueva Era e sob a intitulação do artigo "El Milagro Espiritual Del Brazil", de Humberto Mariotti, que na época era Vice-Presidente da Confederación Espiritista Argentina diz: - O Brasil agora pode considerar-se o País da Nova Revelação, pois está influenciando sobre outros países latino-americanos e chegando já até à América do Norte.

            Esta publicação influenciou a ida de Chico e Waldo aos Estados Unidos, pois órgãos internacionais como a Spiritualist Federation, de Londres e Revue Spirit, de Paris, fundada por Allan Kardec, acreditavam ser importante o entrelaçamento deles com outros países, para que a crença religiosa viesse confirmar os fenómenos mediúnicos ali existentes.

            Chico e Waldo aproveitariam essa visita sadia para conhecer os trabalhos desenvolvidos nesses países. Assim visitaram o Centro Espiritualista dos Dois Mundos, nos Estados Unidos. Procuraram sentarem-se no último banco. Quietos ficaram assistindo o desenrolar da reunião.

            - Éramos quatro brasileiros - dizia Chico, ao nos narrar a sua ida aos Estados Unidos. Não avisamos a ninguém, e viajamos cada um com seus próprios recursos, e ali estávamos na "The Church of the Two Words", nome em inglês. Esse Centro achava-se localizado à rua 3038 L Street, em Washington, DC. Presidia a reunião, continuava Chico, o médium Ministro Gordon Burrughs. Ao término da mesma, uma das senhoras, também médium que compunha a mesa, levantou-se entre outras coisas, indicou-nos, dizendo que "esses quatro brasileiros" que aí se encontram estão em visita aos Estados Unidos, para trazer-nos a tarefa da renovação espiritual e a aproximação maior entre irmãos de outras terras. Disse ainda que essa era uma tarefa difícil ao qual nos propúnhamos, mas que com o auxílio de Jesus e o amparo do Plano Espiritual, tudo seria amenizado.

            Chico ainda nos relatou, que após, em transe, essa mesma médium anunciava que estávamos acompanhados de um professor e de um médico. Sabíamos que era Emmanuel e André Luiz, respectivamente. Seguiram viagem à Pensilvânia, onde conheceram o Campo Espiritualista de Silver Belle, e foram até Nova Iorque onde conheceram o Templo Benéfico Espiritualista e o Templo Espiritualista Universal. Estas narrações ouvimos do próprio Chico e do Waldo, quando em caravana os visitamos, como fazíamos sempre, saindo de Jundiaí, Estado de São Paulo (a autora deste artigo).
Sabemos que Chico e Waldo fundaram em Washington, DC o "Christian Spirit Center", para estudos da difusão da Doutrina Espírita. Aí Chico psicografou várias mensagens em inglês, que depois foram compiladas e publicadas em livro, com o título de "Entre Irmãos de Outras Terras", pela FEB, aqui no Brasil.

            Muitos foram os acontecimentos bons e produtivos dessas viagens, e concluído o roteiro, onde ainda visitaram Portugal, França e Inglaterra, voltaram para Uberaba, cientes que mais um dever fora cumprido, com todo carinho e respeito devidos ao Plano Espiritual que os assistiu. Com mais de 1 milhão e 500 mil exemplares, Nosso Lar é o livro psicografado por Chico Xavier que teve a maior tiragem até hoje.

            A casa de Chico em Uberaba, além de sempre estar com visitas, ainda moravam com ele muitos gatos e cachorros. Seu quintal era repleto de flores, principalmente de roseiras. Indagado pela preferência, ele nos disse que as rosas, assim como outras flores, "explicam nossos amigos espirituais", que elas possuem um corpo fluídico que vai desde o perfume intenso desde as raízes, mas que nós na matéria, só o sentimos através das pétalas. Mas essa essência produzida pela natureza cria uma atmosfera balsamizada, dando por assim dizer, recursos para que os Espíritos Superiores permaneçam no local, com mais disposição para o Amparo Maior, a cada encarnado presente, no local florido, seja em casa ou onde for.

            Chico sempre soube agradecer a Deus pelas belas lições que a Natureza nos envolve. Dizia ele que os rios, mares e fontes são luzes a nos fortalecer o corpo, porque nos ensina a sermos higiénicos, pois lavando-se o corpo, se abençoarmos essa água ela também higieniza nosso espírito, pois seus fluídos são benéficos e logo após esse banho de corpo e alma, nossa sintonia, connosco mesmo nos revitaliza e nos recompõe, para novas actividades materiais e espirituais.

            Chico não permitia que fechassem a janela de seu quarto ao anoitecer. Quando frio ou noite chuvosa, somente o vidro era fechado, isto porque as poucas horas de seu repouso nocturno ele gostava de fazer suas orações olhando para o céu, ver se possível as estrelas e a lua, e até mesmo a chuva caindo sobre a terra.

            Ele dizia, que todo ser humano, deveria olhar mais para o céu, porque as criaturas que souberem fazer suas orações olhando para cima, sentirão que essa prece lhes servirão de Amparo Maior, pois muitos são os Espíritos Missionários, que passam para o socorro a criaturas amarguradas, saudosas de seus entes queridos que partiram e, com isto, espargem a vibração que trazem desses entes queridos a irmanarem paz aos corações, num elo de infinito Amor.

            Lições como estas, todos que iam visitá-lo ouviam de seus lábios. Com todo seu carinho falava sobre todos os assuntos.
Frequentemente ele advertia as pessoas que buscavam orientação sobre a mediunidade, principalmente em pessoas analfabetas que não sabendo ler, não tinham acesso aos livros. A estes, Chico dizia: - Não importa o grau de instrução que a criatura tenha, o que vale é o seu interior. É a forma de pensar e agir para com seus semelhantes. Quando a criatura tem boa índole, na prática da mediunidade, os bons espíritos agem sobre o seu pensamento, pois ela é fácil em aceitar o que vem de Deus. Muitos são letrados, de farta inteligência, mas duros na aceitação Divina. Jesus procurou os analfabetos para serem seus discípulos. Exemplo maior está em Pedro, pescador rude em suas atitudes, normais pela sua própria vida simples, mas sincero.

            Portanto, os problemas mediúnicos dependem de muitos factores interiores e reencarnatórios, pois a mediunidade é a oportunidade de trabalho e refazamento em si e para com a espiritualidade.

            Sempre que Chico visitava os presidiários, nas cadeias públicas, ele comentava com as pessoas que o acompanhavam: "Nossos irmãos estão, não propriamente nos presídios da Terra, mas sim numa escola de tratamento espiritual, físicos e interiores, isto porque acima de tudo, eles também são filhos de Deus, como qualquer um de nós, apenas deixaram-se levar pelos instintos inferiores".

            O semelhante atrai o semelhante, portanto, só recebe ou está mal quem realmente faz ou vive no mal, dizia Chico, citando a "Lei de Causa e Efeito".
E para concluir sobre a questão do perdão, ele observava: "Se procurássemos tolerar-nos uns aos outros, de vez que o amarmos uns aos outros está um tanto quanto difícil ainda, pelo menos deixarmos de nos envolver apenas com a paixão possessiva, pois é esta que nos distancia do perdão, consequentemente do Amor Maior".

            E para tristeza geral, daqueles que como todos nós espíritas, pela manhã do dia 30 de Junho de 2002, chega-nos a notícia do desencarne do nosso amado Chico. Sabemos que embora esse dia fosse de festa total do povo brasileiro, por conquistar mais uma Copa do Mundo Futebolístico, a notícia trouxe constrangimento, mas como ele queria, a data foi propícia porque Chico foi, é e será sempre a "Alegria Cristã", de todos que aprenderam a amá-lo e respeitá-lo.

            Ele continuará a amar o povo, e temos certeza, olhando e ajudando como sempre fez, atendendo e orientando, pois agora é livre. Seu espírito está livre de todas as amarras exigidas pela Terra, pelo mundo material.

            Ele foi o exemplo de renúncia e humildade, de perseverança na Seara do Senhor. Ensinou-nos a viver melhor, a compreender e respeitar as Leis de Deus, por isso seremos eternamente gratos e admiradores constantes do grande movimento de unificação pela Paz que ele deu, e continuará a nos emitir do Mundo Maior, pois onde estiver seu Espírito, emanará o seu eterno fluído de Amor Universal.

Fonte: Seareiro - 06/2004

 

      

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         Conhecido como Chico Xavier, nasceu em Pedro Leopoldo, pequena cidade de Minas Gerais, em 2 de Abril de 1910.

        Filho de João Cândido Xavier e  Maria João de Deus, falecida em 1915. Completou apenas o curso primário e, na infância, trabalhou numa indústria de fiação e tecelagem e foi caixeiro de armazém. Seguiu a carreira de funcionário público junto ao Ministério da Agricultura, aposentando-se em 1958. 
 

        A partir de 1927, deu início a intensa e profícua actividade mediúnica, no recém-inaugurado Grupo Espírita Luiz Gonzaga, em Pedro Leopoldo, psicografando poemas de qualidades literárias inquestionáveis, atribuídos a famosos poetas mortos. Em 9 de Julho de 1932, publica o "Parnaso de além-túmulo", primeira obra que psicografou e que abalaria os meios intelectuais do Brasil, tornando famosa a pacata cidade mineira de Pedro Leopoldo. Em 1938, é publicado o profético e discutido "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", de autoria do Espírito Humberto de Campos. O venerando Espírito Emmanuel foi o seu protector espiritual, tendo se manifestado pela primeira vez em 1931, e o acompanhado até o final da existência física.
 

        Entra todas as obras mediúnicas de Emmanuel, destacam-se cinco romances mediúnicos baseados em fatos verídicos: “Há 2.000 anos...”, “50 anos depois”, “Ave Cristo”, “Renúncia” e “Paulo e Estevão”. Em 1943, surge uma nova entidade espiritual, assinando suas obras com o pseudónimo de André Luiz, responsável por uma magnífica colecção de onze livros, iniciada com a obra “Nosso Lar”.
 

        Em parceria com o também médium Waldo Vieira, psicografou dezessete obras. Além da psicografia, também exerceu mediunidade de psicofonia, vidência, audiência, receitista, entre outras práticas. Em 5 de Janeiro de 1959, por motivos de saúde e a conselho médico, foi residir em Uberaba – MG, onde prosseguiu as actividades mediúnicas na Comunhão Espírita Cristã. Em quase setenta e cinco anos de mediunato, Chico Xavier psicografou quatrocentos e doze livros. Os direitos autorias de todos os livros psicografados foram cedidos por ele, sem qualquer ônus, a editoras e outras instituições espíritas. Em 1981, foi indicado ao Prémio Nobel da Paz.

        Desencarnou aos 92 anos de idade, em Uberaba, em 30 de Junho de 2002.

Chico Xavier psicografou quatrocentos e doze livros

 

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