O HOMEM E O TEMPO
Disse o Homem ao Tempo: - Ó génio triste!
Onde a tua caverna horrenda e escura?
Por que trazes velhice e desventura
À minha carne que te não resiste?
Abomino-te a clava estranha e dura
Que dilacera tudo quanto existe!...
Por que razão me segues, lança em riste,
Estendendo-me as noites de amargura?
Por que fazes o riso envolto em pranto
E derramas o fel do desencanto
No doce vinho da felicidade?
Quem és tu? Monstro ou deus, arcanjo ou fera?
Onde o ninho de sombra que te espera
Nos remotos confins da Eternidade?!
II
Mas o Tempo exclamou: - Ergue-te e lida!...
Sou o pajem divino que te exorta
A seguir para os Céus, de porta em porta,
Amparando-te os passos na subida...
Eras apenas larva indefinida
Quando arranquei-te à treva fria e morta.
Desde então, sou a luz que te transporta,
De forma em forma, para a Grande Vida.
Dou-te alegria e dor, miséria e glória,
Para que guardes, puro, na memória,
O amor de Deus que, em tudo, anda disperso...
Louva o trabalho que te imponho aos dias.
Sem meus braços, irmão, não passarias
De um verme preso às furnas do Universo.
Antero de Quental
(De "Vozes do Grande Além", de Francisco Cândido Xavier - Diversos Espíritos)